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Exposições impressas1

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Sempre gostei de catálogos de exposições, pois são possibilidades reais de prolongar o tempo de visitação de uma mostra. Muitos deles, quando os estou folheando, é como se estivesse vendo novamente a exposição.

Muitas exposições, conheci e visitei apenas pelos catálogos: When Attitudes Become Form: Live in your Head (Berna, Krefeld e Londres, 1969) e Documenta V (Kassel, 1972)2, 550,087 (Seattle, 1969) e 955,000 (Vancouver, 1970)3, Poéticas visuais (São Paulo, 1977)4, 16ª e 17ª Bienais de São Paulo (São Paulo, 1981-1983)5, A história da arte (Rio de Janeiro, 1980)6, apenas para citar algumas que se tornaram preciosas referências na minha formação.

Da mesma forma, conheci e ‘visitei’ exposições e projetos realizados somente para publicações: July, August, September(1969)7, Exposição 0-24 horas (1973)8, Pulgar 8 (2001)9, Point d’ironie (1997-)10, Dreams/Sogni (1999)11, Do it (2004)12, Re-shuffle: Notions of na Itinerant Museum (2006)13, e outras tantas que volta e meia folheio novamente.

Depois, não sei se pelo olhar ou pela vontade de que realmente isso seja possível, comecei a me deparar com alguns livros que soavam como projetos curatoriais: Six Years of Dematerialization 1966-1972, de Lucy Lippard, foi um deles. O mesmo posso dizer para alguns textos: ‘Lista de obras que lidam com diferentes aspectos da estrutura de uma exposição de arte, questionando os limites entre a obra e a exposição’, de Ana Paula Cohen, em A exposição como trabalho de arte (2003)14, ‘Todo el mundo sabe que esto es ninguna parte’, de Bruce Hainley e Siobhan McDevitt, para Pulgar 12 (2004)15, entre outros.

Algumas vezes, me deparo com trabalhos em uma exposição que também poderiam estar dentro de uma publicação, como múltiplo, posto em circulação. Lembro-me de ter visitado várias vezes a exposição de Marilá Dardot, A Biblioteca de Babel (São Paulo, 2005), principalmente, para folhear O banquete (2000), um arquivo de textos, todos sobre o amor, empilhados em folhas transparentes. Pourquoi malady?, texto de Jorgen Michaelsen, cobrindo uma parede inteira na entrada da exposição El Mal de Escritura: um Proyecto sobre Texto e Imaginación Especulativa (Barcelona, 2009-2010), me fez retornar, durante três dias consecutivos, ao Centro de Estudos e Documentação onde se realizava tal mostra. Nessa mesma exposição, encontrava-se outro texto, impresso e encadernado com uma espiral: ARTE E MUNDO APÓS A CRISE DAS UTOPIAS: assim mesmo, em CAIXA ALTA e sem notas de rodapé, de Fabio Morais e Daniela Castro16.

Outras vezes, vejo que uma exposição inteira poderia estar dentro de uma publicação, possibilitando levá-la dentro da bolsa - iguais aos trabalhos acima -, para poder acessar muitas vezes, tantas quanto forem necessárias e desejáveis: Belongingness, de Jorge Menna Barreto (Atlanta, 2003)17, O performer, de Fabio Morais (São Paulo, 2005)18, Notas de rodapé, de Jimson Vilela (Florianópolis, 2011)19, etc.

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Quando realizei a primeira exposição dentro de uma publicação, o PF (2006)20, muitos desses exemplos que citei eram referências21. Comecei a chamar essa primeira investida curatorial de espaço portátil, uma vez que a ideia que rondava todo o projeto era a de que pudesse ser transportada facilmente. Topar, tempos depois, com a denominação exposição portátil no texto ‘As novas possibilidades’, escrito por Walter Zanini para o catálogo da exposição Poéticas visuais (MAC/USP, 1977)22, e incorporá-la como conceito e procedimento dessa iniciativa de realizar exposições impressas foi um processo natural.

A ideia de portabilidade foi algo que comecei a perseguir em todas essas investidas curatoriais. Parte desse assunto, devo dizer, aprendi com Lucy Lippard. Six Years of Dematerialization 1966-1972 não era apenas um livro, era uma exposição com várias exposições dentro si, um arquivo de importantes referências que me acompanha até hoje. A segunda exposição portátil, amor (2007), trazia como subtítulo, leve com você, cujo objetivo era o de potencializar a ação de poder transportar facilmente essa exposição. Do tamanho de um passaporte, foi pensada para ser carregada dentro do bolso. Quando já estava em circulação, li uma entrevista em que Lucy Lippard falava a Hans Ulrich Obrist sobre uma exposição que havia realizado, com pouquíssimos recursos, e que havia sido muito fácil de transportar, pois cabia dentro de uma caixa23.

Coleção, uma publicação realizada com carimbos, foi a exposição seguinte, em 200824. Nessa mostra, Paulo Bruscky era uma referência imediata, bem como o livro/exposição de Hervé Fischer, Art et Communication Marginale: Tampons d'Artistes, publicado em 1974. Trazia também na lembrança a experiência com um carimbo que estava entre a série de múltiplos da exposição Collaborations with Parkett – 1984 to Now (Nova York, 2001), na qual tratava-se da proposição de Lawrence Weiner – um carimbo - realizada para o número 42 da revista Parkett e que, generosamente, estava disponível, junto a uma pilha de papéis, para qualquer um dos visitantes da mostra. Sair do Moma, naquela tarde de abril de 2001, com uma folhinha carimbada foi, no mínimo, uma experiência fora do comum. Em 2003, na exposição Imagética (Curitiba), enquanto observava na Casa Romário Martins (um dos locais dessa mostra) a vitrine repleta de carimbos de Paulo Bruscky, não tive dúvida: saí da exposição segura de que aqueles carimbos só fariam sentido se pudessem ser utilizados, imaginando, quanto seria interessante poder levar as folhinhas impressas com os seus trabalhos.

Em 2009, iniciei outro projeto de exposições portáteis que denominei de Conversas. Uma coleção em processo de pequenos livros que documentam encontros entre artistas expondo seus projetos ou trabalhos já realizados, seus modos e suas concepções sobre arte. No formato de entrevista ou de trocas de correspondências, imagino cada um desses livros como uma proposição curatorial que vislumbra o texto e a fala do artista como um trabalho de arte25.

Pequenos textos, esboços, imagens e projetos, traduzidos como escritura em processo, passaram a ser a motivação para a criação de outra série de exposições impressas que intitulei de A2, assim designada pelo tamanho do papel que é oferecido a cada artista, e que tem sido pensada e apresentada de diferentes modos e formatos, a partir dos cortes e das dobras realizados nesse espaço de exposição26.

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Uma publicação de artista é como uma exposição itinerante que não termina nunca. Além disso, mais do que a distensão de seu tempo de duração de mostra, sua portabilidade permite o seu deslocamento e trânsito pelos mais distintos lugares e contextos.

A iniciativa de poder estabelecer uma publicação (por mais variável que essa possa ser) como um lugar possível para a produção e exposição acentua a forma expandida de pensar um trabalho de arte. Existe uma quantidade expressiva desses trabalhos que não precisam, necessariamente, de paredes, pois são proposições cujo lugar mais adequado para serem mostrados são nas páginas de um livro ou de uma revista, em folhas avulsas ou em cartões, entre outros, como exposições impressas.

Distender a noção de espaço expositivo e de exposição é uma possibilidade a mais que temos de fundar outros territórios de experimentações, outros circuitos e poder somar aos tantos já existentes27.


Notas:

[1] Texto publicado In: DERDYK, Edith (org.). Entre ser um e ser mil: o objeto livro e suas poéticas. SP: Editora SENAC, 2013.

[2] Curadoria de Harald Szeemann.

[3] Organizada e montada por Lucy Lippard.

[4] Curadoria de Walter Zanini e Julio Plaza.

[5] Curadorias de Walter Zanini.

[6] Exposição-obra de Essila Paraiso.

[7] Seth Siegelaub, um dos mais notórios realizadores de exposições impressas, entre 1968 e 1972 editou uma série de exposições para catálogos: November, 1968, com Douglas Huebler. Statements, 1968, com Lawrence Weiner. Xerox Book, 1968, com Carl André, Douglas Huebler, Joseph Kosuth, Lawrence Weiner, Robert Barry, Robert Morris e Sol LeWitt. January 5-31, 1969, com Douglas Huebler, Joseph Kosuth, Lawrence Weiner e Robert Barry. March, 1969, com Alex Hay, Allen Ruppersberg, Barry Flanagan, Bruce Nauman, Carl Andre, Christine Kozlov, Claes Oldenburg, Dan Flavin, Dennis Oppenheim, Dewain Valentine, Douglas Huebler, Ed Ruscha, Ian Baxter, Ian Wilson, James Lee Byars, John Chamberlain, Joseph Kosuth, Lawrence Weiner, Michael Asher, Michael Baldwin, On Kawara, Richard Long, Rick Barthelme, Robert Barry, Robert Morris, Robert Smithson, Robert Huot, Ron Cooper, Sol LeWitt, Stephen Kaltenbach, Terry Atkinson. July, August, September, 1969, com Carl Andre, Daniel Buren, Douglas Huebler, Jan Dibbets, Joseph Kosuth, N.E. Thing C° LTD., Richard Long, Robert Barry, Robert Smithson, Sol LeWitt e Lawrence Wiener. July, August, 1970, para o qual convidou seis críticos e curadores para ocupar, cada um deles, oito páginas da revista Studio International.

[8] Exposição individual de Antonio Manuel, inicialmente prevista para o Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM/RJ), mas que, por ter sido cancelada (por motivos políticos), foi realizada em uma edição extra do diário carioca O Jornal, enviada às bancas e circulada durante as 24 horas do dia de sua publicação.

[9] Pulgar é uma revista independente, de publicação ocasional desde 1999, editada em Caracas, Venezuela, pelo artista Luis Romero. Cada número possui um curador ou artista(s) que são responsáveis por sua edição. Ana Paula Cohen, curadora independente, editou a Pulgar número 8, realizando no espaço de 15 páginas, uma exposição impressa, com a participação dos artistas: Antonio Dias, Dora Longo Bahia, Eliana Bordin, Fausto Yamaji, Geraldo de Barros, Iran do Espírito Santo, Keyla Alaver, Regina Silveira, Ricardo Basbaum, Rosangela Rennó e Sandra Cinto.

[10] Point d’ironie é um projeto de Christian Boltanski, coordenado por Hans Ulrich Obrist e apoiado por Àgnes B. Cada número, que corresponde a duas folhas de tamanho 43cm x 61cm, conta com a participação de um convidado, que pode ser um artista, um escritor, um filósofo, entre outros. São realizados de 6 a 8 números anualmente e sua distribuição, que chega a uma tiragem de 100.000 exemplares, é gratuita e circula no mundo inteiro.

[11] Curadoria de Hans Ulrich Obrist e Francesco Bonami.

[12] Projeto do curador Hans Ulrich Obrist e dos artistas Christian Boltanski e Bertrand Lavier criado em 1993. Inicialmente, circulou como exposição em salas de museus, galerias e instituições culturais. Em 2002 é realizado uma versão online na plataforma e-flux e uma versão livro onde foram compilados os trabalhos desde o inicio da criação desse projeto.

[13] Projeto realizado pelos alunos do Center for Curatorial Studies, Bard College, Annandale-on-Hudson.

[14] Projeto de Jens Hoffmann, Escola de Artes Visuais do Parque Lage, Rio de Janeiro, 2003.

[15] Curadoria de Jens Hoffmann, para a revista Pulgar, com a participação de 12 curadores internacionais convidados para contribuir com a apresentação de uma exposição, única e exclusivamente, com palavras tendo como questão principal o conceito de ‘curar’.

[16] A visita a essa exposição eu credito, especialmente, ao entusiasmo de meu amigo Felipe Prando, expresso em e-mail enviado de Barcelona em dezembro de 2009. ARTE E MUNDO foi publicado em 2010, e Pourquoi malady?, em 2011, ambos pela par(ent)esis.

[17] Disponível em http://jorgemennabarreto.blogspot.com.br/2009/10/belongingness.html. Acesso em abril de 2011.

[18] Em 2009, O performer passou a existir no formato de livro-objeto.

[19] Num comentário por e-mail para Jimson Vilela sobre a vontade de ter a exposição inteira numa publicação, a fim de poder ficar mais tempo e ler atentamente todos os trabalhos ali contidos, ele me respondeu com um arquivo anexado contendo toda a exposição. Imediatamente, imprimi o arquivo.

[20] Com essa exposição portátil, surge a par(ent)esis – uma plataforma que criei em Florianópolis, SC, para publicar projetos artísticos e curatoriais.

[21] Insiro também outra referência, demasiadamente importante, que foi o jornal (e catálogo) Capacete, durante o período de 2001 a 2004.

[22] Todos os trabalhos dessa exposição foram enviados pelo correio. Durante o período da mostra, o público podia fotocopiar grande parte do que estava exposto e levar para casa. Nas palavras de Zanini: ‘O público poderá obter exemplares em xerox da maioria dos documentos exibidos, o que a configurará também como uma exposição portátil’.

[23] Trata-se da exposição c. 7500, realizada em 1973 em sete localidades diferentes. Cada trabalho enviado tinha que caber dentro de um envelope para documentos. Essa exposição também é conhecida como ‘mostra internacional de arte conceitual de artistas mulheres’, indo de encontro ao fato de que, até então, não constavam artistas mulheres em nenhuma mostra de arte conceitual. Participaram: Adrien Piper, Bernadette Mayer, Christine Kozlov, Laurie Anderson, Martha Wilson, Mierle L. Ukeles, Nancy Holt, entre outras.

[24] Em Coleção, cada artista era representado por um ou mais carimbos, confeccionados mediante suas instruções, uma almofada com tinta de impressão e um bloquinho de folhas destacáveis, cujo verso continha as indicações sobre o trabalho e o propositor. Expostos sobre uma mesa, os carimbos ficavam à disposição do público para que realizassem sua própria coleção, que, uma vez construída, poderia ser levada para a casa.

[25] A referência mais imediata para Conversas surgiu após a leitura de Interviews de Hans Ulrich Obrist (Charta, 2003), seguido do projeto Between Artists, coordenado por Alejandro Cesarco. Até 2012 foram publicadas duas ‘conversas’: a primeira, entre Ana Paula Lima e Ben Vautier, Tudo pelo Ben (2009), e a segunda, entre Fabio Morais e Marilá Dardot, blá blá blá (2009). No prelo, a ‘conversa’ entre Ricardo Basbaum e Alex Hamburger, Flying Letters Manifestos.

[26] A2-Diego Rayck (2010), A2-Felipe Prando (2011), A2-Paulo Bruscky (2011), A2-Giorgia Mesquita, A2-Fabio Morais (2012) e A2-Gloria Ferreira (2012). No prelo, A2-Maíra Dietrich, A2-Marilá Dardot, A2-Amir Brito Cadôr e A2-Raquel Stolf.

[27] Ao terminar este breve texto estava relendo o livro Livro ou livro-me: os escritos babilônicos de Hélio Oiticica (1971-1978), de Frederico Coelho (Ed. UERJ, 2010), e me deparei, na página 226, com este fragmento de uma carta de Hélio Oiticica, escrita em 1971, para sua estimada amiga Vera Pedrosa: ‘[...] você sabe de uma coisa: publicações são coisas tão confortáveis de fazer, fascinantes e portáteis, que dá vontade de não fazer outra coisa [...]’.